"Depois, amor... É inútil os pernósticos estarem inventando coisas atrapalhadas pra encherem o amor de trezentas auroras-boreais ou caem no domínio da amizade, que também pode existir entre bigode e seios, ou então principiam sutilizando os gestos físicos do amor, caem na bandalheira. Observando, feito eu, amor de sem-educação, a gente percebe mesmo que nele não tem metafísica: uma escolha proveniente do sentimento que a babosa recebe dum corpo estranho, e em seguida furrum-fum-fum. A força do amor é que ele pode ser ao mesmo tempo amizade. Mas tudo que existe de bonito nele, não vem dele não, vem da amizade grudada nele. Amor quando enxerga defeito no objeto amado, cega: 'Não faz mal!' Mas o amigo sente: 'Eu perdôo você.' Isso é que é sublime no amigo, essa repartição contínua de si mesmo, se repartindo num casal de espíritos amantes que vão, feito passarinhos de vôo baixo, pairando rente ao chão sem tocar nele..."
Mário de Andrade Trecho do conto "Túmulo, Túmulo, Túmulo" in Os Contos de Belazarte". São Paulo , Circulo do Livro, 1991, p.78-79.
Nenhum comentário:
Postar um comentário