domingo, 19 de fevereiro de 2012

                             Visita


                        Todo dia, um vento
                        visita-me o pensamento.
                        Ora revoa,
                        ora refresca.
                        Às vezes agita,
                        outras atordoa.
                        Muitas vezes é festa
                        com alegria  de floresta.
                        Por  momentos me faz refém,
                        também noutra feita, 
                        me afasta, rejeita 
                        Enfim,  janela aberta
                        sai assobiando,
                        menino inzoneiro                                
                        em direção incerta.


                                                               Aureliano


                                                                                        Imagem: Pintura digital  "Menino"  João Werner

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Gustave Caillebotte - 1848-1894

O VALIOSO TEMPO DOS MADUROS

Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para frente do que já vivi até agora.
Tenho muito mais passado do que futuro. Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas. As primeiras ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados. Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares talentos e sorte.
Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas que, apesar da idade cronológica, são imaturas.
Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário-geral do coral.
As pessoas não debatem conteúdos, apenas rótulos.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa,...
Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade.
Quero caminhar perto de coisas e pessoas de verdade,
O essencial faz a vida valer a pena. E para mim, basta o essencial!

                                 Mário de Andrade (1893-1945)