quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Somos todos narizes

Crônica - Donald Malschitzky

Qual sua primeira lembrança na vida? Possivelmente não será um cheiro, mas, se acordarmos nosso inconsciente, é bem provável que ele diga como cheirava o lugar do nascimento, o sangue etc.. As lembranças menos remotas, da infância, por exemplo, já nos remetem a cheiros: nosso quarto, a mãe, a comida que ela fazia, pão assado, lavanda, biscoitos. Com um pouco de esforço, povoarão nossa memória o cheiro das pessoas, do trabalho, do suor, dos perfumes usados por outros- lembra de “Perfume de Mulher”- ?
De nossos sentidos, talvez o menos estudado seja o olfato, apesar dos narizes empinados, torcidos, aguçados, nervosos, curiosos.
Pois descobriram que cada ser humano é um imenso nariz! Temos receptores olfativos em todo o corpo e nossa pele está repleta deles! Parece brincadeira, mas não é. Então aquela coisa de “pintou um clima”, “a química foi perfeita” não é bem ligada a clima ou química, mas a odor, mesmo. Perdeu a graça ou explicou melhor?
Mas tem muita coisa boa nisso: quando esses receptores são expostos ao cheiro de Sandalore, um odor sintético de sândalo muito usado na fabricação de perfumes, começa uma enxurrada de sinais moleculares que, ao que parece, induzem à cura de lesões nos sentidos. Hans Hatt, da Universidade de Ruhr Bochum, na Alemanha, descobriu que a pele se recupera 30% mais rápido de abrasões (raspagens) se há Sandalore presente. Isso pode ser uma revolução no tratamento de pele e, mesmo, de traumas. Ele também descobriu receptores olfativos no fígado, coração, pulmões, cérebro e outros órgãos.
Outra cientista, Grace Pavlath, da Universidade Emory, de ATLANTA, descobriu que quando os receptores de músculos esqueléticos são banhados com Lyra – fragrância sintética com perfume de lírio – acontece a regeneração do tecido muscular.
O caminho ainda é longo, dada a complexidade dessa rede de receptores, mas há todo um imenso universo microscópico se abrindo.  
Receptores olfativos encontrados nos testículos formam uma espécie de sistema químico que mostra o caminho aos espermatozoides até o óvulo. Portanto, de alguma forma, somos cheiro antes de nos tornarmos sopro de vida. E somos perfumados sopros, absorvendo jardins, mesmo quando vivendo as misérias do mundo.



Sobre o autor

    Integrante da Confraria do Escritor e da Associação Confraria das Letras, de Joinville e da ACADEMIA de Letras e Artes de São Francisco do Sul.
    Três livros de poesia publicados (Grafite, Cabeça de Vento e Flechas), todos já esgotados, um livro de depoimentos - "Pequenas histórias de São Bento" - publicado.
    Cronista no Jornal Evolução, de São Bento do Sul (SC), no início dos anos 1990, logo após, no Jornal A Notícia, em Joinville. Atualmente é cronista do jornal A Gazeta, de São Bento do Sul, onde escreve às 2as. FEIRAS , e do Jornal Notícias do Dia, de Joinville (SC), onde escreve às 3as. feiras.