Imagem Chelin Sanjuan
a serenidade...
A
serenidade não é feita nem de troça nem de narcisismo, é conhecimento supremo e
amor, afirmação da realidade, atenção desperta junto à borda dos grandes fundos
e de todos os abismos; é uma virtude dos santos e dos cavaleiros, é
indestrutível e cresce com a idade e a aproximação da morte. É o segredo da
beleza e a verdadeira substância de toda a arte.
O poeta
que celebra, na dança dos seus versos, as magnificências e os terrores da vida,
o músico que lhes dá os tons de duma pura presença, trazem-nos a luz; aumentam
a alegria e a clareza sobre a Terra, mesmo se primeiro nos fazem passar por
lágrimas e emoções dolorosas. Talvez o poeta cujos versos nos encantam tenha
sido um triste solitário, e o músico um sonhador melancólico: isso não impede
que as suas obras participem da serenidade dos deuses e das estrelas. O que
eles nos dão, não são mais as suas trevas, a sua dor ou o seu medo, é uma gota
de luz pura, de eterna serenidade. Mesmo quando povos inteiros, línguas
inteiras, procuram explorar as profundezas cósmicas em mitos, cosmogonias,
religiões, o último e supremo termo que poderão atingir é essa serenidade.
Hermann
Hesse, in 'O Jogo das Contas de Vidro'